Tensão Pré-Aposentadoria

Baixo retorno das aplicações atinge em cheio os ‘cinquentões’, que devem ter de rever planos de encerrar vida profissional.

Por Antonio Perez e Karla Spotorno

A queda da taxa de juros para o menor nível da história abalou os alicerces do mundo dos investimentos no Brasil. Ainda meio atordoado pela redução aguda da rentabilidade das aplicações financeiras simples e de alta liquidez – como fundos DI e Certificados de Depósito Bancário (CDBs) de grandes instituições –, o investidor precisa refazer as contas e ajustar a rota se quiser alcançar o rendimento a que estava habituado. O desafio é maior para quem já está na reta final para a aposentadoria e tem que alterar planos traçados há 10 ou 15 anos. Quem já passou da casa dos 50 anos e se imaginava muito próximo de viver confortavelmente com o dinheiro acumulado durante décadas de trabalho experimenta uma espécie de tensão pré-aposentadoria, dizem especialistas.

“Muita gente está angustiada, porque fez o planejamento para a aposentadoria contando com juros altos”, afirma o economista Rodrigo Menon, sócio da Beta Independent, empresa de aconselhamento financeiro. “As pessoas estão se dando conta de que, se não mudarem seus investimentos, não vão conseguir se aposentar com a renda que desejam”, diz o consultor Mauro Calil.

Imagine, por exemplo, um indivíduo de 50 anos que possui reserva de R$ 500 mil, poupa mensalmente R$ 1.500 e quer se aposentar aos 65 anos com renda mensal de R$ 10 mil. Com taxa de juros real (descontada a inflação) de 2% ao ano, terá, daqui a 15 anos, R$ 984,4 mil. Parece muito, mas não é. Remuneradas também a uma taxa real de 2% ao ano, essas reservas vão se exaurir em nove anos. Ou seja, aos 74 anos, o indívíduo não terá mais dinheiro para se sustentar. E a expectativa de vida dos homens, segundo o mercado segurador, é de 86,4 anos. As mulheres chegam, em média, aos 89,7 anos, pela tábua atuarial BR-SEM de 2010. No mundo dos juros altos, com a Selic rodando os 12% e taxa real por volta de 6%, o quadro era confortável. Após 15 anos, os R$ 500 mil iniciais teriam se transformado em R$ 1,621 milhão. As reservas terminariam quando a pessoa completasse 91 anos.

Mesmo que o Banco Central (BC) inicie este ano o processo de alta da Selic (hoje 7,25%), como esperado por parte dos analistas, a taxa não voltará ao patamar de 12%. Mais: a inflação deve permanecer acima do centro da meta (4,5%), o que manterá os juros reais comprimidos. Em um cenário de alta da Selic, o investidor poderá contar com um juro real de, no máximo, 4% ao ano nas aplicaç~eos mais conservadoras. E isso se fizer retidas anuais, em vez de saques todos os meses. “No curtíssimo prazo, a renda fixa tende a perder da inflação”, diz o consultor Calil.

No caso do candidato à aposentadoria descrito no exemplo, com taxa de 4% ao ano, o dinheiro terminaria quando ele completasse 78,6 anos, bem antes dos 86,4 anos da expectativa de vida estima pelas seguradoras. “Mas o investidor não deve contar com juro real de 4%. O Brasil está em um caminho sem volta para a convergência para níveis próximos aos vistos em países desenvolvidos”, diz Menon, da Beta.

Diante do novo cenário, o investidor precisa se mexer. Para os conservadores, o primeiro passo é diversificar na própria renda fixa. Entram no cardápio fundos deste tipo como crédito privado, fundos imobiliários e papéis como Letras de crédito Imobiliário (LCI), os dois últimos com isenção de Imposto de Renda (IR) sobre os rendimentos. Os mais arrojados podem destinar uma parcela maior para fundos de ações com foco no longo prazo. “As pessoas vão ter que se acostumar com a oscilação da renda variável no curto prazo para alcançar o objetivo lá na frente”, diz o consultor Calil. “Quem estava no fundo DI ou no CDB pode começar a diversificação migrando para fundos imobiliários”, afirma.

Esses conselhos valem, contudo, para quem está há 15 ou 10 anos da data programada para aposentadoria, dizem os especialistas. Para quem vai se aposentar em cinco anos ou menos, aumentar o risco do porfólio com a renda variável é muito perigoso. Pode faltar tempo para recuperar um eventual perda. A alternativa mais segura é elevar a poupança mensal. “Vários estudos já mostram que poupar mais tem um impacto maior no resultado que um ganho de 1 ou 2 pontos percentuais a mais na rentabilidade”, afirma William Eid, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Também é possível adiar a aposentadoria e continuar contatando com a remuneração regular. Essa foi a opção de Fernando Moya, especialista em gestão de pessoas, 61 anos. Em 2011, Moya participou do programa de demissão voluntária da Associação Comercial de São Paulo, na qual era Superintendente de Recursos Humanos: “Logo depois de sair, percebi que será muito difícil depender apenas da aposentadoria pública e da renda dos planos de previdência PGBL e VGBL com os quais contribuí. Foi então que decidi voltar ao mercado”.

Há cerca de sete meses, Moya conseguiu uma recolocação. Trabalha em período integral e não tem plano de voltar a se aposentar tão brevemente. O motivo é o seu orçamento doméstico. Ele descobriu que os gastos não ficam muito menores nessa fase da vidam quando, por exemplo, os filhos estão adultos e o financiamento habitacional, quitado. Ele e a mulher Rachel, de 54 anos, sempre gostaram de viajar, ir ao teatro, ao cinema, de comprar livros. “Em uma cidade como São Paulo, a oferta cultural é muito grande. Quero aproveitar, porque não tenho mais idade para ficar adiando meus planos. Meu futuro é agora. E, trabalhando, consigo manter meu padrão de vida”, diz o executivo.