Longevidade em alta e previdência oficial com limite de valor do benefício são o presente e também o futuro de quem terá de se aposentar. As duas variáveis podem impulsionar a oferta de fundos de pensão como tática para manter o quadro de pessoal e fomentar a poupança.
O mundo dos fundos de pensão, dentro da chamada previdência complementar fechada, há muito tempo deixou de ser exclusividade de grifes do ramo de estatais como Banco do Brasil, Petrobras e Caixa Econômica Federal. A modalidade entrou no radar de empresas privadas como estratégia para ampliar benefícios e formar poupança para melhorar a renda dos empregados na aposentadoria. A alternativa ganhou mais impulso com o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, que exige mais tempo de contribuição à previdência oficial, alvo de frequentes mudanças de regras e que opera com teto de valor, hoje em R$ 4.159,00.
Em 2013, o número de participantes (que são os futuros beneficiários) da modalidade alcançou 2,4 milhões de pessoas, com quase 700 mil assistidos (que já estão recebendo as pensões), sendo 180 mil ligados aos planos líderes – Previ, Petros e Funcef. Os ativos somavam até junho cerca de R$ 630 bilhões, 14,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Frente aos anos de 1990, quando o setor somava 1,63 milhão de participantes e ativos de R$ 150 bilhões, a cifra atual até pode parecer superlativa, mas entidades de previdência e especialistas advertem que o potencial é muito maior. E comparam com outros países – nos Estados Unidos, o patrimônio de fundos previdenciários representa 70,5% do PIB (dados de 2011), e, na Holanda, 138%.
A nova tábua de mortalidade, divulgada pelo IBGE no começo de dezembro e referente a 2012, elevou de 74,1 anos para 74,6 anos a expectativa do brasileiro ao nascer. Na prática, isso implica menor valor de benefício ou mais tempo de trabalho para compensar o maior tempo de vida. A Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência (Abrapp) estima que apenas 3% da População Economicamente Ativa (PEA) esteja vinculada a algum fundo de pensão, como patrocinador (quando a empresa contribui com uma ou mais partes da poupança e o empregado com outra) ou como instituidor, quando é iniciativa de associações ou segmentos que alimentam a poupança. A estimativa da Abrapp é de que ao menos 10% a 15% dos assalariados formais recebam acima do teto do INSS, clientela preferencial da complementação. São 324 entidades em operação no País, reguladas pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). O diretor-presidente da Abrapp, o gaúcho José de Souza Mendonça, analisa que o número poderia ser muito maior e que recorrer a fundos deveria entrar no mesmo grau de prioridade quanto oferecer plano de saúde ou vale transporte a funcionários. Uma maior expansão, admite Mendonça, depende de mudança na cultura de empregados e gestores de empresas. “O trabalho é incentivar para que as pessoas ingressem nas modalidades e que as empresas montem os planos.”
Aposentado do Banco do Brasil há dois anos, Elizeu Beckmann é um exemplo do que muitos trabalhadores gostariam de alcançar. Depois de ficar na instituição por mais de 30 anos, Beckmann pôde recorrer ao fundo ao completar 54 anos. Ele chegou a pagar mais dois anos de INSS, regime geral de Previdência, para atender ao quesito de tempo de contribuição, de 35 anos. Com isso, conseguiu constituir uma pensão semelhante à ativa. “Muitos ficam mais tempo no banco, pois há vantagens da remuneração da ativa. Mas, por outro lado posso, acessar benefícios do tempo de trabalho e a poupança que isso gera”, contrapõe o bancário aposentado.
Casado com Denise e pai de um casal, Beckmann também colocou na balança outra medida. “Quando entramos no banco, é tradição aderir ao plano, mesmo não sendo obrigatório. Eu me preparei desde os 19 anos para esse momento”, confessa o aposentado. A vantagem de virar inativo aos 54 anos? Beckmann cita a chance de poder aproveitar mais o convívio com a família. Além disso, ele pensa em estudar e mesmo ampliar o lazer. “A atividade do banco é muito desgastante”, lembra. Mas o assistido da Previ revela que a postura é de eterna vigilância. “É um plano ligado a uma estatal, se alguém fizer algo errado, deixará na mão milhares de pessoas.”
O doutor em demografia e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE) José Eustáquio Diniz Alves cita que a previdência complementar ganha mais força para quem busca manter a renda além do teto do sistema oficial. Como o regime geral segue a repartição simples (e não de capitalização), o governo vai ter grande dificuldade para financiar o crescente número de aposentados que vão requerer seus benefícios, adverte Alves. “Teremos um quadro de diminuição do percentual de pessoas que contribuem. Com isso, o equilíbrio atuarial do sistema vai ficar cada vez mais comprometido”, preocupa-se o professor da Ence.
Fonte: Jornal do Comércio (Porto Alegre)